Que pena o governo naotomar conta da abitacao e tornala um museu ou biblioteca ou qualquer lugar publico. Lembro-me na minha infancia passar ali e ate ia ao consultorio do Dr. Alberto???
Boas Noelia. Pois sim, o Dr. Alberto de Medeiros, delegado de saúde do Centro de Saúde da Horta. Foi a última pessoa a habitar a "Bagatelle". E realmente é uma pena tremenda o facto da casa não ter sido aproveitada, tanto pelo governo tanto pelos donos! A casa e jardim devem ter sido impressionantes outrora, e deve ser incrível voltar a observar tudo isto anos e anos depois.
De facto é uma dor de alma ver o estado a que esta Casa chegou. A primeira residência dos Dabney, construída com materais, técnicas e carpinteiros americanos, o que faz com que tenha um estilo único e inimitável (e ainda hoje bem visível, apesar das alterações posteriores que já sofreu). Primeira sede do Consulado Americano nos Açores, serviu de residência a diferentes membros da Família ao longo de todo o século XIX, mesmo depois do ramo principal se ter mudado para a sua segunda residência, a "The Cedars House", mais recente, actualmente Residência Oficial da Presidente da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, algo bem digno da sua categoria [que está numa das fotos antigas reproduzidas acima, a primeira da esquerda, a preto e branco]. Menos sorte teve a "Bagatelle". Depois de ter sido um dos centros da vida social faialense do século XIX, no tempo em a Horta tinha consulados e relações com quase todas as nações da europa e por aqui passavam regularmente príncipes, embaixadores e altas individualidades das mais diversas origens, todos eram recebidos em bailes nos salões dos Dabney. Todos brincavam com o facto de tão majestoso edifício ser uma "Bagatelle" - uma "Bagatela", como lhe chamava e chama o povo-, mas todos levavam boas recordações da casa e das recepções e saraus que por lá se davam. Num tempo em que os visitantes tinham de confiar na hospitalidade da Ilha para pernoitar, foi num dos anexos da Bagatelle que surgiu o primeiro hotel do Faial, em meados do século, tutelado por um dos seus funcionários. Foram também os Dabney pioneiros na fotografia no Faial e deixaram um conjunto de álbuns que ainda hoje são consultados e difundidos como uma importante fonte histórica para a sua época. Depois da família deixar em definitivo Portugal, em 1892, ficou alguns anos fechada, ao cuidado de um procurador, até que foi comprada pelo Dr. Alberto Goulart de Medeiros [se a memória não me falha em relação ao nome]. Com a morte deste, em 1940, passou para a posse dos quatro filhos, ficando dividida em duas partes (correspondentes ao primeiro e ao segundo andares, à semelhança do que já ocorrera cem anos antes, no tempo dos Dabney), ocupadas por dois dos seus filhos: o Dr. Alberto Campos de Medeiros, mais conhecido como "Dr. Campos", que tinha consultório no rés-do-chão, falecido em 1979, com geração; e a sua irmã Rosalina, última habitante, falecida já nos anos 90 (1996?). [cont.]
[cont.] Com a nova família continuou a ser uma das principais casas faialenses e a receber visitantes conhecidos. Entre eles destaque-se o Maestro Victorino d'Almeida (cuja mãe era faialense e irmã do Dr. Goulart de Medeiros), que passava regularmente férias no Faial, ficando em casa da sua prima Rosalina. Foi na sequência de uma dessas visitas, em 1986, levou por companhia a realizadora austríaca Erika Pluhar, que se apaixonou de tal forma pela casa, toda recheada ao estilo do século XIX, e pela sua residente, que decidiu voltar e fazer um filme sobre o tema, que saiu na Áustria em 1992 com o título "Rosalinas Haus" ("A Casa da Rosalina"), difundido ainda hoje em vários países e praticamente desconhecido em Portugal. A Bagatelle serviu também como um dos cenários da série "Mau Tempo no Canal", de 1989. Com a morte da Rosalina os herdeiros, seus sobrinhos, organizaram um leilão em que uma parte do recheio foi vendida, ficando a restante no interior do edifício, que ficou ainda assim bem cheio de móveis e outros objectos (até os retratos de família ficaram nas paredes!), sendo depois pilhado ao longo das duas últimas décadas, até chegar ao estado em que está hoje. Houve de facto algumas tentativas de compra do imóvel, incluindo por parte do Governo Regional, na altura em que se estavam a adquirir edifícios para albergar as várias Secretarias Regionais (e no tempo das "vacas gordas"), mas os proprietários alegaram sempre que o valor oferecido era baixo e que preferiam esperar por uma oferta mais elevada, isto ao mesmo tempo que se ia degradando e perdendo o valor de dia para dia. O Maestro Victorino d'Almeida, da penúltima vez [que eu tenha conhecimento] que visitou a Horta, em Janeiro de 2007, numa sessão pública em que apresentou o "Rosalinas Haus", no Teatro Faialense, e depois de ter ido pessoalmente visitar a casa de família onde tinha passado férias, afirmou que "nos outros países há ruínas, em Portugal só há escombros!", frase bem elucidativa da situação. O futuro? Quanto ao edifício em si não há volta a dar: os danos são já de carácter estrutural e não têm reparação possível (a não ser a alguém de fundos ilimitados e com uma vontade mais forte que o tempo), resta-lhe, portanto, a ruína até ao desaparecimento. O espólio que ainda tinha no interior encontra-se hoje espalhado por um sem número de residências particulares do Faial (e provavelmente mais além...), o que, a meu ver, mesmo nos casos em as "aquisições" de peças resultaram de pilhagem directa, não é de modo algum condenável mas antes louvável, pois assim estão a preservar-se elementos da nossa história que caso contrário estariam para sempre condenados, e mais ainda tendo em conta que a própria família em nada se preocupou com a sua manutenção. E à medida que o tempo passa essa mesma família vai crescendo e assim gerando mais e mais herdeiros, o que torna o processo legal cada vez mais complicado, além de que, a surgir um possível interessado na compra (algo pouco provável nos tempos que correm), poucas mais opções teria que demolir todo o complexo, o que acarreteria uma despesa extra imensa. Mas até lá, sem futuro à vista, a antes faustosa "Bagatelle" vai sendo aos poucos carcomida pelo tempo e gasta por todos os curiosos, interessados ou visitantes com intenções mais ou menos suspeitas e outras bagatelas que tais, que por lá vão passando e, regra geral, levando consigo um pedaço de história, da nossa história e da nossa herança cultural, se bem que a maioria nem se apercebe disso.
Cumprimentos, Tiago Simões da Silva [tiago.f.simoes.silva@gmail.com]
Muito obrigado Tiago por ter partilhado toda esta informação connosco e ter colaborado em conhecer-mos mais dados sobre os casos (e casas) que cá mostramos!
Que pena o governo naotomar conta da abitacao e tornala um museu ou biblioteca ou qualquer lugar publico. Lembro-me na minha infancia passar ali e ate ia ao consultorio do Dr. Alberto???
ResponderExcluirBoas Noelia. Pois sim, o Dr. Alberto de Medeiros, delegado de saúde do Centro de Saúde da Horta. Foi a última pessoa a habitar a "Bagatelle". E realmente é uma pena tremenda o facto da casa não ter sido aproveitada, tanto pelo governo tanto pelos donos! A casa e jardim devem ter sido impressionantes outrora, e deve ser incrível voltar a observar tudo isto anos e anos depois.
ResponderExcluirCumps
De facto é uma dor de alma ver o estado a que esta Casa chegou.
ResponderExcluirA primeira residência dos Dabney, construída com materais, técnicas e carpinteiros americanos, o que faz com que tenha um estilo único e inimitável (e ainda hoje bem visível, apesar das alterações posteriores que já sofreu). Primeira sede do Consulado Americano nos Açores, serviu de residência a diferentes membros da Família ao longo de todo o século XIX, mesmo depois do ramo principal se ter mudado para a sua segunda residência, a "The Cedars House", mais recente, actualmente Residência Oficial da Presidente da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, algo bem digno da sua categoria [que está numa das fotos antigas reproduzidas acima, a primeira da esquerda, a preto e branco].
Menos sorte teve a "Bagatelle". Depois de ter sido um dos centros da vida social faialense do século XIX, no tempo em a Horta tinha consulados e relações com quase todas as nações da europa e por aqui passavam regularmente príncipes, embaixadores e altas individualidades das mais diversas origens, todos eram recebidos em bailes nos salões dos Dabney. Todos brincavam com o facto de tão majestoso edifício ser uma "Bagatelle" - uma "Bagatela", como lhe chamava e chama o povo-, mas todos levavam boas recordações da casa e das recepções e saraus que por lá se davam. Num tempo em que os visitantes tinham de confiar na hospitalidade da Ilha para pernoitar, foi num dos anexos da Bagatelle que surgiu o primeiro hotel do Faial, em meados do século, tutelado por um dos seus funcionários. Foram também os Dabney pioneiros na fotografia no Faial e deixaram um conjunto de álbuns que ainda hoje são consultados e difundidos como uma importante fonte histórica para a sua época. Depois da família deixar em definitivo Portugal, em 1892, ficou alguns anos fechada, ao cuidado de um procurador, até que foi comprada pelo Dr. Alberto Goulart de Medeiros [se a memória não me falha em relação ao nome]. Com a morte deste, em 1940, passou para a posse dos quatro filhos, ficando dividida em duas partes (correspondentes ao primeiro e ao segundo andares, à semelhança do que já ocorrera cem anos antes, no tempo dos Dabney), ocupadas por dois dos seus filhos: o Dr. Alberto Campos de Medeiros, mais conhecido como "Dr. Campos", que tinha consultório no rés-do-chão, falecido em 1979, com geração; e a sua irmã Rosalina, última habitante, falecida já nos anos 90 (1996?). [cont.]
[cont.]
ResponderExcluirCom a nova família continuou a ser uma das principais casas faialenses e a receber visitantes conhecidos. Entre eles destaque-se o Maestro Victorino d'Almeida (cuja mãe era faialense e irmã do Dr. Goulart de Medeiros), que passava regularmente férias no Faial, ficando em casa da sua prima Rosalina. Foi na sequência de uma dessas visitas, em 1986, levou por companhia a realizadora austríaca Erika Pluhar, que se apaixonou de tal forma pela casa, toda recheada ao estilo do século XIX, e pela sua residente, que decidiu voltar e fazer um filme sobre o tema, que saiu na Áustria em 1992 com o título "Rosalinas Haus" ("A Casa da Rosalina"), difundido ainda hoje em vários países e praticamente desconhecido em Portugal. A Bagatelle serviu também como um dos cenários da série "Mau Tempo no Canal", de 1989.
Com a morte da Rosalina os herdeiros, seus sobrinhos, organizaram um leilão em que uma parte do recheio foi vendida, ficando a restante no interior do edifício, que ficou ainda assim bem cheio de móveis e outros objectos (até os retratos de família ficaram nas paredes!), sendo depois pilhado ao longo das duas últimas décadas, até chegar ao estado em que está hoje. Houve de facto algumas tentativas de compra do imóvel, incluindo por parte do Governo Regional, na altura em que se estavam a adquirir edifícios para albergar as várias Secretarias Regionais (e no tempo das "vacas gordas"), mas os proprietários alegaram sempre que o valor oferecido era baixo e que preferiam esperar por uma oferta mais elevada, isto ao mesmo tempo que se ia degradando e perdendo o valor de dia para dia. O Maestro Victorino d'Almeida, da penúltima vez [que eu tenha conhecimento] que visitou a Horta, em Janeiro de 2007, numa sessão pública em que apresentou o "Rosalinas Haus", no Teatro Faialense, e depois de ter ido pessoalmente visitar a casa de família onde tinha passado férias, afirmou que "nos outros países há ruínas, em Portugal só há escombros!", frase bem elucidativa da situação.
O futuro? Quanto ao edifício em si não há volta a dar: os danos são já de carácter estrutural e não têm reparação possível (a não ser a alguém de fundos ilimitados e com uma vontade mais forte que o tempo), resta-lhe, portanto, a ruína até ao desaparecimento. O espólio que ainda tinha no interior encontra-se hoje espalhado por um sem número de residências particulares do Faial (e provavelmente mais além...), o que, a meu ver, mesmo nos casos em as "aquisições" de peças resultaram de pilhagem directa, não é de modo algum condenável mas antes louvável, pois assim estão a preservar-se elementos da nossa história que caso contrário estariam para sempre condenados, e mais ainda tendo em conta que a própria família em nada se preocupou com a sua manutenção. E à medida que o tempo passa essa mesma família vai crescendo e assim gerando mais e mais herdeiros, o que torna o processo legal cada vez mais complicado, além de que, a surgir um possível interessado na compra (algo pouco provável nos tempos que correm), poucas mais opções teria que demolir todo o complexo, o que acarreteria uma despesa extra imensa. Mas até lá, sem futuro à vista, a antes faustosa "Bagatelle" vai sendo aos poucos carcomida pelo tempo e gasta por todos os curiosos, interessados ou visitantes com intenções mais ou menos suspeitas e outras bagatelas que tais, que por lá vão passando e, regra geral, levando consigo um pedaço de história, da nossa história e da nossa herança cultural, se bem que a maioria nem se apercebe disso.
Cumprimentos,
Tiago Simões da Silva [tiago.f.simoes.silva@gmail.com]
Muito obrigado Tiago por ter partilhado toda esta informação connosco e ter colaborado em conhecer-mos mais dados sobre os casos (e casas) que cá mostramos!
ResponderExcluircumprimentos!
Caro "Miguel em Ruínas" se possível contacte-me gostaria de lhe enviar algumas fotos, obrigado! cu2ju@sapo.pt
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